O fenómeno destas
eleições foi indiscutivelmente o das candidaturas independentes. Com efeito, o “partido”
dos independentes foi o quarto mais votado, com treze Câmaras, mais do
que dois partidos com assento parlamentar, o CDS e o BE.
Um olhar mais atento
impõe-se sobre estas candidaturas. Quantas delas são verdadeiramente
independentes, ou seja, descontando as deserções partidárias, quantas ficam?
Provavelmente nenhuma.
Significa isto que os “independentes"
não o são, de facto. Acontece que os candidatos que não foram escolhidos pelas
estruturas partidárias viram-se forçados a desertar e a concorrer à margem
dos partidos, dos seus partidos. Fosse outra, a escolha, e estes candidatos não
teriam deixado os partidos.
Que lições se podem
tirar deste fenómeno?
Que os partidos
cometeram “erros de casting” ao escolher o candidato A em detrimento do
candidato B. Ora, isso só é verificável após e não antes das eleições.
Que as estruturas locais
não “ouviram” os militantes ou as “forças vivas do concelho”.
Que as escolhas das
direcções nacionais dos partidos se sobrepuseram às escolhas locais, o que evidencia
um “desconhecimento do terreno”, ou seja, a má escolha é atribuível à “falta de
diálogo”.
Ou, pura e simplesmente,
que é preciso mudar a forma de fazer política neste país, e a começar desde logo
pelo princípio, isto é, pela escolha dos candidatos.
Advogamos a instituição
de eleições primárias nos partidos. Assim:
1 - Qualquer pessoa, militante ou não, deve poder candidatar-se
pelo partido cuja tábua de valores e princípios mais se identifica com a sua.
2 – Os diferentes candidatos apresentam os seus programas e a
discussão é feita em torno destes, e não na contagem de espingardas junto dos
militantes.
3 – Havendo um debate entre programas, emerge, em princípio, o
melhor de entre eles, não necessariamente aquele que seria o preferido pelas
estruturas locais ou nacionais. É esta a melhor forma de impedir a perpetuação
de caciques.
4 – Os candidatos são escolhidos pelos eleitores, pelos
votantes, e não por um reduzido número de militantes ou um ainda mais reduzido
número de dirigentes.
5 – A escolha dos eleitores nas primárias aproximar-se-á da
escolha nas eleições autárquicas. Será maior, a participação eleitoral, visto que os eleitores irão votar no "seu" candidato e não em alguém que lhes foi imposto.
Se os partidos fossem
inteligentes, se a escolha dos candidatos tivesse sido feita com recurso a
eleições primárias, o PSD não teria perdido o Porto e Gaia, e o PS não teria
perdido Matosinhos, por exemplo.
Se os partidos forem
inteligentes, mais tarde ou mais cedo acabarão por perceber que as primárias
podem funcionar a favor, e não contra eles. Mas para isso, os partidos têm que
deixar de ser um fim para passarem a ser apenas um meio de acesso ao poder. E
esse salto ainda está por dar.